
Quando iniciei o curso secundário, comecei a vislumbrar que a realidade que conhecia era mais ampla, dividida e antagônica; ampliada, porque mais abrangente e antagônica, a começar pela divisão extremada que é permanente, sobretudo, no campo das ideias, reflexo da realidade socioeconômica. De início, fiquei muito confuso no meio do acirrado tiroteio ideológico entre as correntes políticoideológicas: a direita, que era considerada reacionária e desonesta, e a esquerda, democrática, progressista e honesta.
Obviamente, como, creio, ainda ocorre com a maioria dos jovens atuantes, posicionei-me à esquerda, porquanto acreditava piamente na pregação do viés democrático, cuja síntese era definida pelo saudoso jornalista mineiro, Fernando Sabino (1923-2004), cujo pensamento se resumia nesta lapidar credível frase: “Democracia é oportunizar a todos o mesmo ponto de partida. Quanto ao ponto de chegada, depende de cada um.”
A propósito, atribui-se ao saudoso físico e matemático inglês, Isaac Newton (1642-1727) a afirmação (lei): “Tudo muda e todo se transforma…”, com o que concordo em parte, pois algo se perde!
Ainda me lembro de, comumente, ouvir a raivosa dicotomia direita x esquerda: “Fulano é de direita” e “Beltrano é de esquerda”, que fora substituída pela furiosa dicotomia: “Fulano é honesto” e “Beltrano é desonesto”. A dicotomia, substituída, continua, entretanto, além do foco, o significado sofreu substancia mudança.
Por quê?
A citada mudança derivou, sobretudo, da permuta de foco políticoideológico pregado até por renomados filósofos – o italiano Nicolau Maquiavel (1469-1527), o britânico Bertrand Russel (1872-1970) e italiano Antônio Gramsci (1891-1937) – que, deturpando a bela teoria do jesuíta Hermann Basembaum – Cui finis est licitus, etiam media sunt licita = Quando o fim é lícito, lícitos também são os meios – que contemplava a legítima defesa [matar (meio) para não morrer (fim)], incentivava a pratica de ilícitos: subtrair verba pública (meio) para, vedando alternância no Poder, nele perpetuar-se (fim), o que, inegavelmente, violenta a Democracia.
É indiscutível que a dicotomia direita x esquerda revela extremismos inconciliáveis, de natureza permanente, o que, em busca de solução razoável, sobretudo, justa e pacífica, me remete a certos bordões pertinentes – “nem tanto à terra, nem tanto ao céu” ou “nem tanto à terra, nem tanto ao mar” – o que aponta para civilizado ideário do saudoso Rui Barbosa (1849-1923): “A pior Democracia é preferível à melhor das Ditaduras”.
O ser humano, por ser racional, em vez de perenemente congruente, é levianamente contraditório, pois, embora teórica e publicamente, pregue, metodicamente, princípios, aparentemente, democráticos, na realidade, cultua princípios distinto do democrático: Essa conduta tem nome: fake news.
Concluindo, relevo a importância de sermos autênticos, também, no exercício da Política para construirmos a verdadeira Democracia, invocando dicção do estadista britânico, Winston Churchill (1874-1965), assim vazada: “Ninguém pretende que a democracia seja perfeita ou sem defeito. Tem-se dito que a democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos”, ou seja, dentre todas, a Democracia é a melhor.
Vitória, ES, 28.07.2020
Salvador Bonomo
Ex-Deputado estadual e Promotor de Justiça inativo.